segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O que foi esquecido - Conto




            Através de uma estrada sinuosa, em um ônibus o qual não sabia o destino. Não tinha idéia de onde vinha nem onde estava. Seus pensamentos eram caóticos, buscava as lembranças de seu passado, mas não encontrava nada. Olhava pela janela e a paisagem não lhe parecia familiar, desejava que estivesse voltando para casa, mas algo lhe dizia que não.

            Estava muito cansado e repentinamente caiu novamente em sono profundo.
            – Ei você. Acorde, já chegamos à rodoviária. – disse o motorista do ônibus cutucando seu ombro.
            Abriu os olhos com dificuldade, sua cabeça estava doendo.
            – Onde nós estamos? – perguntou com voz desorientada.
            – Em Ribeirão Pires. – respondeu automaticamente o motorista com uma cara de espanto pela ignorância do destino do ônibus por parte do passageiro dorminhoco.
            – Entendo... De onde eu vim? Onde eu embarquei nesse ônibus?
            – Você embarcou em Porto Seguro... Você está bem? – questionou ainda mais espantado o motorista.
            – Estou sim... – Obrigado. – disse se levantou e desceu do ônibus.
            Se deparou com uma rodoviária em estilo colonial não muito grande, tudo a sua volta o fazia acreditar que se tratava de uma cidade turística. 
            (Será que estou de férias?)
            Vagava pelo centro de uma cidade que não conhecia, mas o encantava. Logo se deparou com uma pequena praça que de um lado tinha um palco e do outro contava com quiosques de dois andares também em estilo colonial.
            (Que lugar incrível... Tomara que essa lembrança não fuja da minha mente...)
            Foi até o final da praça e encontrou entrou em um pequeno shopping, olhou as vitrines e logo chegou a um banco circular do qual era possível assistir a uma televisão que ficava suspensa. Sentou-se para assistir ao noticiário.
            Sua cabeça ainda latejava, apenas via as imagens distorcidas na tela da TV, o som era quase inaudível. Der repente viu sua foto surgir na tela.
            (Será que estou desaparecido e estão a minha procura?!!!)
            Saltou do banco, esticou o braço para aumentar o volume.
            – “A policia continua buscando Julio Carlos, o homem que assassinou brutalmente a namorada a punhaladas”.
            Sentiu seu mundo cair. Uma bomba explodiu em sua mente disseminando fragmentos de lembranças que abalaram sua vida.
            (Julio Carlos? Esse... Esse é meu nome?!)
            Olhou a volta, viu um policial e saiu correndo em direção ao banheiro. Entrou e se trancou. Sentou-se na privada, cravou os cotovelos nas coxas e sustentava a cabeça com as mãos. Imagens de seu passado passavam como relâmpagos vividos em sua retina.
            Ele podia ver sua face. O nome dela era Julia, tinha longos cabelos escuros, olhos castanhos que brilhavam, brilhavam... Estavam marejados de lagrimas, demonstravam pavor.
            (Ela está com medo. O que você vai fazer? O que eu fiz?)
            Julia estava com as costas na parede, não tinha para onde correr. As lagrimas já havia começado a escorrer pela sua face, mas isso não parecia causar compaixão em seu iminente assassino.
            – “Você vai ter o que merece!” – disse Julio se aproximando com um punhal na mão direita.
            (Não! Ela não merece!!! Seu cretino!)
            Se contorcia tentando impedir a si próprio de cometer um ato que acabou com a vida de quem mais amava e com a sua própria.
            – “Pare com isso! Vamos conversar!!!” – dizia Julia tentando ganhar tempo.
            Ele já havia se aproximado o suficiente, seu braço se elevou, segurando o punhal, ele desceu, ele atingiu o peito dela. Um grito mortal brotou do fundo de sua alma. Seu braço subia e descia. Seus gritos eram cada vez mais estridentes, pareciam que estavam rasgando suas cordas vocais. As punhaladas continuaram, porém os gritos ficaram mais fracos até que cessaram. 
            (Eu fiz isso? Eu não mereço viver!)
            Não conseguia pensar em nada. Sua obsessão era tirar sua própria vida dessa vez. Saiu do banheiro e foi até o policial que estava em uma lanchonete do Shopping. Avançou na arma do policial que tentou impedir que ele a tomasse, mas conseguiu se contorcer de forma que sua cabeça ficasse na mira do revólver, seu dedo velozmente se enveredou até o gatilho e o acionou. Houve um estampido. Podia sentir o gosto libertador da morte enquanto o metal quente dilacerava seu cérebro.
            Lembranças perturbadoras faiscaram em sua mente nessa fração de segundo.
            (Julia não era minha namorada! Ela namorava meu irmão gêmeo! Eu não sou o Julio, meu nome é Marco! Meu irmão que a matou. Matou porque Julia queria terminar com ele! Eu a amava e ela também me amava. Ela queria ficar comigo, ela me prometeu que ia terminar com ele, nós poderíamos ser felizes... Ele não aceitou. Ele a matou. Não eu! Ele fugiu... Eu também. Fugi da tristeza, mas ela me acompanhou. Minha mente está se esvaziando, a dor está diminuindo. Eu posso sentir o cheiro de seu perfume em meio as roseiras. Estou feliz vou te reencontrar em breve.)
            Seu corpo caiu inerte já sem vida no chão.
            Sua alma partiu seguindo o rastro do perfume de sua amada.


Rafael Farias
Escritor do livro Tevet - O Quê é Real?
http://tevetbook.com/

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